O Acordo Gaúcho, instituído pela Lei nº 16.241/2024 e regulamentado em julho de 2025, representa um marco na modernização da política tributária do Rio Grande do Sul. Ao introduzir a transação tributária como ferramenta central para a regularização de dívidas, o Estado dá um passo relevante na redução da litigiosidade, no estímulo ao ambiente de negócios e no equilíbrio das contas públicas.
Esperado há anos pelo setor produtivo, o programa surge como resposta à necessidade de flexibilizar a cobrança de débitos, garantir maior segurança jurídica e criar um ambiente mais competitivo para atração de investimentos.
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Acordo Gaúcho: um marco na política tributária do estado
A adesão do Rio Grande do Sul à transação tributária, prática já consolidada em estados como São Paulo e Santa Catarina, alinha o Estado às tendências nacionais de modernização fiscal. A proposta reconhece a importância de adaptar as condições de cobrança à realidade financeira do contribuinte, promovendo justiça fiscal e viabilidade econômica.
Segundo Pedro Schuch, sócio-diretor da SW Advogados e especialista em Direito Tributário, a ausência de mecanismos de negociação travava a expansão de negócios no RS:
“O investidor gaúcho sempre teve receio de ampliar seus negócios devido à falta de flexibilidade na negociação de dívidas tributárias. Isso era uma trava significativa.”
O que é o Acordo Gaúcho?
O Acordo Gaúcho é um programa de transação tributária voltado à renegociação de débitos inscritos em dívida ativa. Diferente de parcelamentos tradicionais como o Refis, a medida leva em conta a capacidade de pagamento do contribuinte (CAPAG), com critérios objetivos para descontos, prazos e condições.
O programa contempla dívidas tributárias e não tributárias, assegurando maior previsibilidade jurídica e fomentando a regularização fiscal sustentável.
Quem pode aderir?
Pessoas físicas e jurídicas podem aderir ao programa, desde que possuam débitos inscritos em dívida ativa do Estado.
Débitos elegíveis:
- ICMS, IPVA, ITCD e taxas estaduais;
- Multas administrativas de órgãos do Estado;
- Débitos em execução fiscal;
- Créditos classificados como irrecuperáveis ou de difícil recuperação.
Débitos excluídos da transação:
- Multas penais;
- Débitos de ICMS de optantes do Simples Nacional (salvo autorização específica);
- Débitos com garantia integral em depósito judicial com decisão favorável ao Estado;
- Devedores contumazes.
Modalidades de transação
O programa oferece duas formas principais de adesão, de acordo com o perfil e as condições de cada contribuinte:
Transação por adesão
- Contribuinte aceita integralmente as regras de editais publicados pela Receita Estadual e PGE-RS;
- Processo simplificado e rápido.
Transação por proposta individual
- Permite negociação personalizada de valores, garantias e prazos;
- Sujeita à análise da capacidade de pagamento.
Regulamentação do Acordo Gaúcho: aspectos legais e operacionais da transação tributária
O Acordo Gaúcho, instituído pela Lei nº 16.241/2024, foi regulamentado por decreto estadual publicado em 14 de julho de 2025, formalizado pelo Governador Eduardo Leite. Com base nessa regulamentação, o Estado do Rio Grande do Sul passa a permitir que pessoas físicas e jurídicas renegociem débitos com o fisco estadual em condições excepcionais de pagamento, que incluem descontos expressivos sobre multas e juros, bem como prazos ampliados para quitação.
A proposta central da norma é conferir efetividade à recuperação de créditos classificados como de difícil recuperação, especialmente aqueles em fase de discussão judicial ou cujo custo de cobrança inviabiliza a continuidade da ação fiscal. Ao mesmo tempo, busca-se viabilizar a retomada econômica de contribuintes atingidos por adversidades econômicas e sociais recentes, como a pandemia de COVID-19 e os eventos climáticos extremos ocorridos em 2024.
A regulamentação confere competência à Procuradoria-Geral do Estado (PGE-RS) e à Receita Estadual para editar normas específicas por meio de editais públicos, os quais deverão estabelecer regras próprias conforme a natureza do crédito tributário ou não tributário envolvido — incluindo débitos de ICMS, IPVA, ITCD, taxas estaduais e multas administrativas.
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Primeiros editais: foco no IPVA
O primeiro edital publicado no âmbito do Acordo Gaúcho terá como objeto a transação de dívidas de IPVA vencidas até o exercício de 2023, prevendo as seguintes condições:
- Desconto de até 90% sobre o valor das multas e 50% sobre os juros para pagamento à vista;
- Alternativamente, parcelamento em até 12 vezes, com redução de até 70% das multas e 30% dos juros.
Futuramente, novos editais deverão contemplar débitos de ICMS, considerados os de maior impacto fiscal e cuja negociação é amplamente aguardada por diversos setores produtivos.
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Débitos abrangidos e incentivos previstos na regulamentação
O escopo do programa abrange uma ampla gama de dívidas fiscais e não tributárias que estejam sob competência do Estado do Rio Grande do Sul.
Os principais créditos passíveis de transação são:
- Tributos estaduais: ICMS, IPVA, ITCD, bem como outras taxas vinculadas ao Estado;
- Multas administrativas impostas por autarquias ou fundações públicas estaduais;
- Débitos em fase de execução fiscal ou objeto de ações judiciais que discutam a exigibilidade tributária;
- Créditos classificados como de pequeno valor, ou ainda com relevante controvérsia jurídica ou baixa recuperabilidade, incluindo os considerados irrecuperáveis.
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Benefícios jurídicos e econômicos conferidos pelo programa
A depender do perfil do contribuinte e da natureza do crédito, o Acordo Gaúcho oferece benefícios distintos que podem ser estratégicos à regularização da situação fiscal. Dentre os principais, destacam-se:
1. Redução de encargos legais (multas e juros)
- Até 70% de desconto para microempresas, pessoas físicas, empresas em recuperação judicial ou afetadas por desastres naturais;
- Até 65% de desconto para os demais contribuintes;
- Débitos de pequeno valor podem ter redução de até 50% sobre o montante total consolidado.
2. Alongamento dos prazos de pagamento
- Micro e pequenas empresas: até 145 parcelas mensais;
- Empresas de médio e grande porte: até 120 parcelas;
- Créditos de menor valor: possibilidade de parcelamento em até 60 meses, com ajustes proporcionais nos benefícios.
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3. Compensação com créditos tributários
- Admite-se o uso de precatórios estaduais e créditos acumulados de ICMS, inclusive relativos à substituição tributária, para compensação parcial da dívida;
- As condições, limites e hipóteses de utilização desses créditos serão determinadas em cada edital específico;
- Trata-se de alternativa estratégica para empresas com saldos credores acumulados e impacto imediato na redução do desembolso financeiro.
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4. Condições específicas para situações excepcionais
- Contribuintes em processo de falência, liquidação ou recuperação judicial;
- Empresas impactadas por calamidades climáticas ou eventos extraordinários, conforme análise da administração tributária.
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Limitações e vedações à transação
Apesar da amplitude do programa, a regulamentação do Acordo Gaúcho prevê restrições claras, entre as quais:
- Multas de natureza penal não podem ser objeto de transação;
- Débitos de ICMS de contribuintes optantes pelo Simples Nacional só poderão ser incluídos mediante autorização expressa em edital;
- Estão excluídos os débitos totalmente garantidos por depósito judicial e cuja decisão judicial seja favorável ao Estado;
- Contribuintes classificados como devedores contumazes, ou seja, com histórico de inadimplemento sistemático, não são elegíveis ao programa.
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Benefícios diretos para a economia com o programa de transação tributária
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1. Atração de investimentos
Ao reduzir a insegurança jurídica, programa transforma o Rio Grande do Sul em um ambiente mais amigável para negócios. Investidores que antes evitavam o estado devido à rigidez de sua política tributária agora encontram condições mais favoráveis para suas operações.
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2. Redução da litigiosidade
Outro impacto significativo é a redução da litigiosidade. Com a permissão para acordos entre contribuintes e o fisco, espera-se uma diminuição considerável no volume de processos judiciais relacionados a débitos tributários.
- Pessoas físicas, micro e pequenas empresas podem obter descontos de até 70% sobre multas e juros.
- Demais contribuintes podem conseguir abatimentos de até 65%.
- Utilização de precatórios e créditos de ICMS para quitar até 75% da dívida.
- Alternativa vantajosa para empresas que acumulam créditos tributários e buscam reduzir o desembolso financeiro imediato.
Isso não apenas alivia a sobrecarga do sistema judiciário, mas também acelera a resolução de disputas, beneficiando ambas as partes.
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3. Reestruturação empresarial
Empresas locais também ganham a oportunidade de reestruturar suas finanças. Ao reduzir o peso de dívidas passadas, essas organizações podem concentrar seus esforços em iniciativas de crescimento, criando bases mais sólidas para o futuro.
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4. Uma Solução para a dívida ativa
A dívida ativa do estado, que historicamente apresenta números elevados, também deve ser impactada positivamente. Com a possibilidade de acordos extrajudiciais, o governo estadual pode recuperar parte significativa desses valores de forma mais rápida e com custos menores. Isso representa um alívio para as finanças públicas, ao mesmo tempo em que reduz a pressão sobre contribuintes em situação de inadimplência.
6. Equilíbrio financeiro e competitividade
Pedro Schuch destaca que os benefícios do Acordo Gaúcho não são exclusivos para o setor privado. O governo estadual também se beneficia, tanto pelo aumento na arrecadação quanto pela redução no estoque de dívidas ativas.
“Trata-se de um avanço que beneficia todas as partes. Menos litígios, mais arrecadação e, acima de tudo, um mercado mais dinâmico e competitivo”, conclui o advogado.
Com mais recursos em caixa e um ambiente de negócios favorável, o estado se alinha a um movimento nacional de modernização e simplificação tributária, tornando-se mais atrativo para investidores nacionais e estrangeiros.
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Perspectivas futuras com o Acordo Gaúcho
O Acordo Gaúcho não é apenas uma política fiscal; é uma estratégia de desenvolvimento econômico. Seus efeitos devem se estender por décadas, proporcionando uma base mais sólida para o crescimento de empresas locais e a atração de novos empreendimentos. Além disso, a medida promove uma mudança cultural no relacionamento entre o fisco e os contribuintes, estabelecendo um diálogo mais produtivo e menos conflituoso.
Embora os resultados ainda sejam iniciais, a promulgação da transação tributária já é vista como uma mudança positiva pelo setor produtivo e pelas autoridades estaduais. As expectativas são altas, mas o consenso é que o estado está no rumo certo para construir um ambiente de negócios mais dinâmico, competitivo e próspero.
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